Não, não somos todos iguais – e ainda bem

João Pedro Claro

Membro do Departamento Administrativo da MAIS

06 de maio de 2022

“ser livre é conseguir flutuar entre a diversidade e a multiplicidade, sem perder a própria identidade”.

Estou a escrever este artigo no dia vinte e cinco de Abril. Um dia em que a diversidade, em todas as suas vertentes, é celebrada. Neste artigo irei abordar a importância de termos organizações e instituições socialmente diversas, em que os funcionários têm o direito a exprimir a sua cultura, identidade, e acima de tudo, opinião. Irei também explorar exemplos de modelos e políticas organizacionais que promovem este tipo de ambientes e, por fim, alguns riscos adjacentes a estratégias de diversidade mal desenhadas.

Os professores de gestão Cristian Deszö da universidade de Maryland e David Ross da universidade de Columbia, EUA, estudaram o efeito que a diversidade de género tem nas maiores empresas do índice S&P 1500. Primeiro analisaram a composição de género dos departamentos executivos entre 1992 e 2006. Depois olharam para a performance financeira de cada empresa. A conclusão foi que, “em média, a representação feminina nas equipas executivas leva a um aumento de $42 milhões no valor das empresas”. (Philips, 2022).

Também mediram a “intensidade de inovação” através do rácio entre despesas em R&D e ativos, e descobriram que empresas que priorizavam inovação tinham maiores ganhos financeiros quando as mulheres eram parte do top management. Outro estudo feito em 2003 por Orlando Richard, professor de gestão da universidade do Texas em Dallas concluiu que a diversidade racial tinha um efeito semelhante: Richard e os seus colegas inquiriram 177 bancos norte-americanos, depois analisaram a base de dados obtida, comparando performance financeira, diversidade racial e a ênfase que os presidentes dos bancos colocavam na inovação. “Para bancos focados na inovação, aumentos na diversidade racial estavam inequivocamente relacionados com melhor performance financeira“(Philips, 2022).

Mas porque é que a diversidade causa tanto boost na performance das empresas e organizações? Vários estudos apontam para que quando a inovação e as novas ideias são valorizadas, a diversidade aumenta a capacidade cognitiva do grupo, o que por sua vez resulta em melhores decisões, seja porque “num grupo diverso somos forçados a antecipar mais as respostas do nosso interlocutor de forma a atingir consensos mais facilmente”(Philips, 2022), seja porque inconscientemente assumimos que os nossos semelhantes possuem a mesma informação que nós, o que implica que na presença da diferença, partilhemos mais as nossas ideias. Um estudo de 2014 conduzido por dois investigadores de Harvard olhou para 1.5 milhões de artigos científicos escritos entre 1985 e 2008, a descoberta foi que “artigos escritos por grupos etnicamente diversos receberam mais citações que grupos compostos por pessoas do mesmo grupo” (Philips, 2022). Este maior número de citações é o resultado de maior diversidade intelectual. Sabendo isto já conseguimos compreender melhor os resultados dos estudos de Deszö, Ross e Richard anteriormente analisados.

 

Hoje em dia, cada vez mais líderes estão conscientes dos benefícios resultantes de uma organização socialmente diversa, mas poucos sabem que medidas e abordagens aplicar para conseguir atingir este objetivo.

Num artigo de 1996 (mas ainda muito relevante) escrito por David A. Thomas e Robin J.Ely, publicado na Harvard Business Review, são expostas diversas correntes no que toca à gestão de diversidade. Os autores identificam os problemas de cada um destes paradigmas e identificam um novo, capaz de ultrapassar os obstáculos anteriormente identificados.

Esta publicação identifica duas perspectivas sobre a diversidade habitualmente  seguidas pela maioria das organizações: O paradigma da discriminação e justiça é caracterizado por um ambiente de trabalho com funcionários diversificados mas com as mesmas práticas organizacionais. Esta abordagem não está preocupada em customizar o trabalho tendo em conta as idiossincrasias e particularidades de cada grupo, sendo que é esta customização que trás de facto os benefícios de um capital humano diversificado. O outro paradigma mainstream é o de acesso e legitimidade. Esta corrente assenta na ideia de que a diversidade deve ser implementada com o objetivo de ganhar quotas em mercados diversificados, por outras palavras, contratar staff diverso dá à organização o acesso a mercados que de outra forma seriam difíceis de conquistar.

Algumas abordagens à diversidade, como a da discriminação e justiça podem afetar negativamente certos funcionários – Se a organização só se focar em contratar um staff diverso, mas depois dificulta a promoção destes funcionários, os mesmos sentem-se estagnados. O modelo de acesso e legitimidade também pode fazer com que o funcionário pertencente a uma minoria se sinta usado.

O novo paradigma proposto por Thomas e Ely tem o nome de aprendizagem e eficácia e promove a ideia de que “estamos todos na mesma equipa, com as nossas diferenças – não apesar delas” (Thomas and Ely, 1996). Este modelo reconhece o valor na singularidade dos trabalhadores e incentiva a organização a internalizar estas mesmas idiossincrasias de forma a poder aprender e crescer com elas.

Os autores identificaram um conjunto de condições necessárias para que este modelo funcione. Entre estas condições podemos encontrar a necessidade para as organizações encorajarem a partilha de opiniões, criarem uma expectativa de elevados padrões de performance para todos e terem uma missão bem clara e articulada.

As organizações que queiram adotar esta abordagem têm de tomar quatro ações decisivas: “identificar como é que diferenças identitárias afetam as relações dentro da organização; trabalhar em eliminar formas de subordinação que inibam total contribuição; legitimar discussões abertas e assegurar que a confiança na organização se mantém intacta” (Thomas and Ely, 1996).

O objetivo destas mudanças no modus operandi organizacional tem também como objetivo criar diversidade vertical/ hierárquica. Para tal é “necessário e prioritário o aumento da performance e das taxas de promoção em grupos minoritários” (Rice, 2012). Exemplos de iniciativas podem incluir: Rotação de profissionais com mérito demonstrado entre cargos relacionados com diversidade, com o objetivo de auxiliarem a implementação de novas abordagens e identificarem possíveis obstáculos a estas novas abordagens; Formações/ treinos de diversidade; Definição de códigos de conduta internos que visem o combate à discriminação; Criação de um departamento de diversidade dedicado a avaliar o percurso dos indivíduos após a sua contratação.

Ainda neste tópico, é de extrema relevância referir a importância e risco dos códigos de conduta. Um código de conduta que restrinja ou condicione de forma excessiva o léxico e as ações dos funcionários, pode ter como consequência uma limitação da liberdade de expressão dos mesmos e pode até mesmo exacerbar divisões pré-existentes dentro da organização. Este tipo de situações é grave, não só para as organizações, mas também para a sociedade em geral pois em vez de caminharmos numa direção de tolerância e crescimento, desviamo-nos para uma cultura de cancelamento.

Para concluir, a jornada da diversidade social nas organizações é paralela à da democracia. É uma jornada que se faz coletivamente e a passos de bebé, e tal como um bebé que, na tentativa de caminhar, tropeça, de vez em quando também nós tropeçamos e falhamos. Deixo-vos com esta frase do escritor Dimos Iksilara que condensa a minha opinião sobre este tema:

“ser livre é conseguir flutuar entre a diversidade e a multiplicidade, sem perder a própria identidade”.

Fontes:

Philips, K., 2022. How Diversity Makes Us Smarter. [online] Greater Good. Available at: <https://greatergood.berkeley.edu/article/item/how_diversity_makes_us_smarter#:~:text=Diversity%20enhances%20creativity.,unfettered%20discoveries%20and%20breakthrough%20innovations> [Accessed 25 April 2022].

Thomas, D. and Ely, R., 1996. Making Differences Matter: A New Paradigm for Managing Diversity. [online] Harvard Business Review. Available at: <https://hbr.org/1996/09/making-differences-matter-a-new-paradigm-for-managing-diversity> [Accessed 25 April 2022].

Rice, J., 2012. Why Make Diversity So Hard to Achieve?. [online] Harvard Business Review. Available at: https://hbr.org/2012/06/why-make-diversity-so-hard-to-achieve [Accessed 25 April 2022].