Burnout e a importância da sua prevenção dentro das organizações

Leonor Ramos

Licenciada em Gestão no ISEG

3 de dezembro de 2021

Com o ano a chegar ao fim, é importante refletir sobre o stress que acumulámos ao longo dos últimos doze meses. As incertezas da pandemia e a adaptação inesperada a novos métodos de trabalho são alguns dos fatores que, em 2021, contribuíram para a subida dos níveis de burnout entre profissionais que já se encontravam sobrecarregados. É, por isso, crucial reconhecer e avaliar os riscos da síndrome de burnout dentro das empresas e identificar o que estas podem fazer para os minimizar.

O que é ao certo a síndrome de burnout?

O conceito de burnout foi introduzido em 1974 pelo psicólogo Herbert J. Freudenberger e, apesar de perdurar até aos dias de hoje, o seu significado foi sofrendo algumas alterações. Em 2019 a Organização Mundial da Saúde (OMS) incluiu a síndrome de burnout na 11ª Classificação Internacional de Doenças (CID-11) e atualizou a sua definição com o intuito de a caracterizar mais como um fenómeno ocupacional e menos como um transtorno de saúde mental. Oficialmente, burnout é definida como sendo “uma síndrome que resulta de stress crónico mal gerido decorrente da atividade profissional. É caracterizada por três dimensões: sensação de esgotamento de energia, ou exaustão; aumento da distância mental do indivíduo com o trabalho ou sentimentos de negativismo ou cinismo em relação ao trabalho; e reduzida eficácia profissional.” [1]
De forma simplificada burnout não é nada mais, nada menos que um estado de exaustão física, mental e emocional provocado por stress excessivo e prolongado. Ocorre quando nos sentimos sobrecarregados ou emocionalmente esgotados e deixamos de conseguir atender às nossas obrigações como habitualmente. Indivíduos com síndrome de burnout podem sentir-se culpados tendendo a isolar-se e a pensar de forma negativa, por isso este fenómeno não afeta só a vida profissional como também a vida pessoal e pode mesmo constituir risco para a saúde, aumentando a possibilidade de desenvolver doenças relacionadas com o sono, obesidade, diabetes, doenças cardiovasculares, envelhecimento precoce, ansiedade e depressão. Os principais sintomas associados à doença são a fadiga crónica, a exaustão contínua, distúrbios de concentração, lapsos de memória, desorganização, falta de energia, alterações de personalidade, baixa autoestima e baixo senso de realização pessoal [2].

De que maneira afeta os portugueses?

Entre 26 países europeus analisados em 2021, Portugal é o que apresenta maior risco de burnout para os seus trabalhadores [3] com 38,6% a relatar a existência de problemas relacionados com a saúde mental no local de trabalho. Adicionalmente, um inquérito feito pela Deco Proteste em 2018, revela que 1 em cada 3 trabalhadores corre risco de burnout e que os empregados de lojas e supermercados (43%), os profissionais de saúde (39%), os trabalhadores fabris ou da indústria (30%) e os que trabalham em serviços administrativos (37%), ou em profissões ligadas ao ensino (28%) são os mais afetados [4]. Em 2021, o setor bancário também se destacou ao apresentar níveis de exaustão física, cognitiva e emocional superiores à média nacional [5] e um estudo feito em 2020 revelou que 50% dos alunos do ensino superior em Portugal apresenta sintomas de “burnout académico” [6].

Problemas de saúde mental relacionados com o trabalho têm, como seria de esperar, sérias consequências na produtividade das organizações e na qualidade do output das mesmas. Burnout provoca mudanças comportamentais que afetam diretamente a performance do trabalhador e resultam muitas vezes em absentismo, diminuição da produtividade, falta de comprometimento, baixa motivação e insatisfação organizacional, sentimentos de negativismo e desprezo em relação ao trabalho e redução da saúde física e mental necessária para executar as tarefas diárias. Por estas razões, o burnout não deve ser visto apenas como um estado psicológico individual, mas também como um fenómeno coletivo que provoca danos a nível organizacional, económico e sociocultural.

É crucial que as empresas reconheçam estes perigos e que adotem uma abordagem séria em relação às consequências que representam para a saúde e bem-estar dos trabalhadores. Só depois será possível atuar de forma eficaz no combate à doença, criando condições que permitam reduzir os riscos psicossociais no local de trabalho e manter níveis sustentáveis de comprometimento e satisfação. Felizmente, para muitas empresas a saúde mental dos seus colaboradores já é uma prioridade clara, mas, em certos contextos, as atmosferas extremamente competitivas, o excesso de carga de trabalho e a complexidade das tarefas subsequentes da natureza da atividade profissional, dificultam uma boa gestão emocional, até para os próprios indivíduos. A verdade é que o trabalhador é confrontado com cada vez maiores exigências cognitivas, físicas e emocionais em ambientes de constante mudança e isso exige um apoio mais aprofundado por parte das empresas.

Como se previne burnout em contexto organizacional?

Tendo em atenção as características específicas de cada atividade profissional e os fatores de risco que estão em causa, as instituições devem focar-se na construção de locais de trabalho seguros que ajudem a formar estilos de vida saudáveis e que permitam um bom equilíbrio entre a vida profissional e a vida pessoal. Da mesma forma, o trabalho em equipa e a entreajuda entre colegas deve ser promovido de modo a melhorar o senso de comunidade, estimular o comprometimento organizacional e incentivar a comunicação aberta e transparente dentro das empresas. Adicionalmente, as organizações devem compensar os colaboradores adequadamente, de forma a aumentar a eficácia e a produtividade e favorecer a qualidade de vida no trabalho. Finalmente, como medida preventiva, as empresas devem promover ações de formação que permitam aos trabalhadores adquirirem competências para fazer face ao stress (como workshops, acompanhamento psicológico e avaliação periódica dos riscos psicossociais) [5,7].

Como já foi mencionado, burnout resulta de stress crónico mal gerido e, para evitar que ocorra, é essencial que o trabalhador possa descansar apropriadamente sem ser incomodado pelos seus compromissos laborais. Porém, com o aumento do trabalho remoto por conta da pandemia covid-19, os deveres de casa rapidamente se misturaram com as obrigações profissionais e a linha que separa o trabalho e o lazer deteriorou-se. A boa notícia é que no mês de novembro o parlamento português aprovou uma lei que proíbe empresas de entrarem em contacto com os seus trabalhadores após o expediente e, para além de Portugal, vários países começaram a implementar medidas inovadoras para garantir que a saúde mental dos funcionários fosse tomada em consideração no local de trabalho – como é o caso de alguns países nórdicos que introduziram a semana de trabalho de quatro dias para dar resposta aos níveis alarmantes de stress e desgaste por parte dos funcionários.

É importante relembrar que o nosso estado emocional também depende de nós. É fácil ignorar sintomas de burnout quando estamos extremamente focados naquilo que temos para fazer. De repente, os objetivos tornam-se mais importantes que a nossa saúde e bem-estar, mas quanto mais trabalhamos acima do nosso limite pior é a nossa produtividade e mais rapidamente começamos a perder as capacidades a que estávamos habituados. Reconhecer quando devemos parar para fazer uma pausa, saber pedir ajuda e comunicar abertamente sobre como nos estamos a sentir são skills de inteligência emocional, que nos permitem regular o nosso estado emocional e contribuem para a eficiência do nosso trabalho e para uma melhor qualidade de vida a longo prazo.

Fontes:

[1] https://www.who.int/news/item/28-05-2019-burn-out-an-occupational-phenomenon-international-classification-of-diseases

[2] Lapa TA, Madeira FM, Viana JS, Pinto-Gouveia J. Burnout syndrome and wellbeing in anesthesiologists: the importance of emotion regulation strategies. Minerva Anestesiol 2017;83:191-9. DOI: 10.23736/S0375-9393.16.11379-3

[3] https://smallbusinessprices.co.uk/european-employee-burnout/

[4] https://www.deco.proteste.pt/saude/doencas/noticias/burnout-um-terco-dos-portugueses-em-risco

[5] https://www.mais.pt/atividadesindical/informacao/on_line/Paginas/Mais%20Bancario%20online%209/estudoburnout.aspx

[6] In H. Pereira, S. Monteiro, G. Esgalhado, & I. Leal (Orgs.). 13º Congresso Nacional de Psicologia da Saúde – Actas (pp. 399-407). Lisboa: Edições ISPA

[7] Leitão, João, Dina Pereira, and Ângela Gonçalves. 2021. “Quality of Work Life and Contribution to Productivity: Assessing the Moderator Effects of Burnout Syndrome” International Journal of Environmental Research and Public Health 18, no. 5: 2425. https://doi.org/10.3390/ijerph18052425