As "arrows" de Suga

Sofia Branco

Aluna de licenciatura em Economia no ISEG, 3ºano; Membro do ISEG Business Club

20 de novembro de 2020

Quando Yoshihide Suga foi nomeado primeiro-ministro japonês há cerca de dois meses, o novo líder abraçou vários desafios, nomeadamente relacionados com o envelhecimento da população, a instabilidade orçamental no setor público e a atual crise provocada pela pandemia Covid-19.

De facto, a elevada dívida pública da economia japonesa hoje já é duas vezes maior do que o seu PIB nominal e, em 2019, a população japonesa com 65 anos ou mais representava 28% da população total. Como tal, é essencial entender de que maneira é que alguns fatores sociais, demográficos e económicos podem vir a influenciar a economia japonesa não só a nível interno, como também a nível internacional.

"A economia japonesa depara-se com três grandes desafios atuais."

É um facto que a dívida pública japonesa é muito elevada. No entanto, é importante responder à questão: Quem detém a dívida?

Efetivamente, uma pequena fração da dívida japonesa é detida pelo estrangeiro. Os próprios japoneses (Governo e investidores) suportam grande parte da dívida pública (o Banco do Japão detém cerca de 43% da dívida pública japonesa). Para além dos títulos do governo japonês (JGB) detidos pelo Banco do Japão, o capital criado por empresas é usado por investidores para comprar os títulos referidos. Portanto, de certa forma, os japonesas “compram” a sua própria dívida.

O sucesso do setor privado e empresarial japonês e a atual competitividade das exportações japonesas são os principais “motores” da sustentabilidade da dívida detida pelo setor público. No entanto, a dimensão da dívida japonesa ainda é uma fragilidade real para a sua economia.

Adicionalmente, importa também notar que o Japão é uma economia credora a nível mundial, já que as empresas japonesas investem muito no estrangeiro. Em 2020, o Japão detém cerca de 18% da dívida total dos EUA (é a economia com uma maior fração da dívida americana). Logo, para além do Japão deter a maior dívida pública do mundo, é também a maior economia credora, a nível mundial.

"Primeiramente, o declínio populacional, e o aumento da fração da população envelhecida na população total, o que significa que cada reformado é sustentado por cada vez menos trabalhadores. "

"Em segundo lugar, a valorização contínua do iene face ao dólar levanta a questão: qual o futuro da competitividade das exportações japonesas? "

Para além da dívida pública, o Japão apresenta ainda algumas debilidades como taxas de inflação muito reduzidas, o decréscimo e o envelhecimento populacional e a crise no mercado laboral que carecem de respostas, através de políticas e reformas eficientes.

Nesta conformidade, a economia japonesa depara-se com três grandes desafios atuais.

Primeiramente, o declínio populacional, e o aumento da fração da população envelhecida na população total, o que significa que cada reformado é sustentado por cada vez menos trabalhadores. Assim sendo, não só os custos com segurança social, como também os gastos governamentais com serviços de saúde para a população cada vez mais envelhecida aumentam, o que tem uma contraparte negativa, pois o governo vai diminuir os gastos em outros setores da economia.

Em segundo lugar, a valorização contínua do iene face ao dólar levanta a questão: qual o futuro da competitividade das exportações japonesas?

É verdade que quando o iene começou a valorizar inicialmente face ao dólar, em 1990’s, a economia manteve um excedente comercial. Este ficou a dever-se não só à redução dos preços dos bens exportados e ao seu valor acrescentado elevado (setores da maquinaria e veículos, entre outros), como também à redução dos preços das importações (o que beneficiou bastante os produtores, nomeadamente no setor têxtil).

No entanto, hoje o iene continua a valorizar-se em relação à moeda americana e, ao mesmo tempo, economias concorrentes asiáticas (China, Taiwan, Coreia do Sul, Singapura) apresentam-se cada vez mais competitivas, o que pode “ameaçar” a competitividade dos preços japoneses no mercado internacional. E, dado que as exportações representam uma percentagem elevada do PIB (Gráfico 1), é importante para a saúde da economia japonesa continuar a exportar produtos e serviços para o estrangeiro.

Em terceiro lugar, surge o desafio de controlar a elevada dívida pública, dado que a economia precisa de estímulos devido a um crescimento do PIB ainda muito débil (Gráfico 2).

Deste modo, o novo primeiro-ministro tem em mãos um desafio crítico: atenuar o impacto da atual crise pandémica na economia (o que carece de um plano de estímulos à atividade económica) e, ao mesmo tempo, diminuir a elevada dívida pública japonesa. Para além disso, o envelhecimento da população, o aumento da pobreza e a valorização do iene face ao dólar são questões que devem ser confrontadas.

Urge, dado o referido, que as “arrows” de Suga sejam resistentes o suficiente para enfrentar tais desafios e assegurar a competitividade e sustentabilidade da economia japonesa.

"Em terceiro lugar, surge o desafio de controlar a elevada dívida pública, dado que a economia precisa de estímulos devido a um crescimento do PIB ainda muito débil"

Gráfico 1

Fonte: World Bank

Gráfico 2

Fonte: World Bank

Fontes:

https://data.worldbank.org/indicator/SP.POP.65UP.TO.ZS?locations=JP

https://www.newyorkfed.org/medialibrary/media/research/current_issues/ci2-1.pdf

https://www.oecd-ilibrary.org/urban-rural-and-regional-development/oecd-territorial-reviews-japan-2016_9789264250543-en